Outro dia, um leitor deste blog me perguntou se era seguro andar por Pequim. Na hora, eu pensei: “Não é seguro, é muito seguro”.
De fato, já ouvi mais de um brasileiro citar a quase ausência de violência urbana como um dos fatores-chave para ter escolhido morar na China ou no Japão.
Tanto nos bairros mais chiques de Pequim como em lugares perdidos da capital, em becos, de noite ou de dia, em táxis, metrôs, andando a pé ou de carro, nunca me senti insegura. E isso é uma grande liberdade se comparado ao medo que, muitas vezes, eu sentia em Brasília, cidade que tem seus picos de sequestros-relâmpago.
Fora de Pequim, até hoje, também nunca me senti sob risco.
Mas, para deixar de lado a “sensação” e melhor embasar esse texto, cito o Estudo Global sobre Homicídios de 2013 da UNODC (braço da ONU para assuntos de crime e drogas).
O documento classifica os países em seis categorias a depender da taxa de homicídios. O Brasil ocupa a quinta categoria mais alta em termos de ocorrência de homicídios, enquanto China e Japão estão na categoria mais baixa.
Na conta geral, 36% dos homicídios contabilizados em 2012 ocorreram nas Américas, outros 31% na África e 28% na Ásia. As sub-regiões mais preocupantes, aponta o estudo, são o Sul da África, América Central e América do Sul. Dentro da nossa sub-região, o país campeão de homicídios é a Venezuela, seguido pela Colômbia e pelo Brasil.
Segundo o estudo, a taxa do Brasil era de 25,2 homicídios para cada 100 mil habitantes em 2012. A do Japão era 0,3 para 2011 (dado mais recente disponível); e a taxa da China era 1 para o ano de 2010. A soma do número absoluto de homicídios na China e no Japão em um ano é menor que o número do Brasil.
Outro dado interessante é que as Américas são a única região em que predomina o uso da arma de fogo como instrumento para o homicídio –66% dos casos, contra 28% na África e Ásia e 13% na Europa.
“A manutenção de altos níveis de homicídios nas Américas é o legado de décadas de violência relacionada à política e ao crime, que impediu o declínio do nível de homicídio em alguns países. No entanto, níveis de homicídio em alguns países das Américas, como o Brasil, estão agora sendo estabilizados, embora em um nível alto, enquanto em outras regiões, países com taxas historicamente altas, como África do Sul, Lesoto, Rússia e países da Ásia Central, estão conseguindo quebrar seu ciclo de violência e têm registrado queda nas taxas de homicídio”, diz um trecho do estudo.
Sobre o Brasil, especificamente, o estudo diz que a taxa de homicídios se manteve relativamente constantes nos últimos 30 anos, mas importantes mudanças aconteceram, com a redução no eixo Rio-São Paulo e o aumento em Estados do Norte e Nordeste.
É claro que, na China, há outras formas de violência. Há notícias diárias de assassinatos, a pena de morte é aplicada no país e há relatos de conhecidos que foram furtados mesmo em bairros nobres da capital.
Abordei o recorte de homicídios como forma de mostrar uma semelhança entre a China e o Japão –este último, país de onde o blog foi escrito nesta última semana, excepcionalmente– e como maneira de colocar em perspectiva a insegurança pública que percebemos no Brasil.
Em 2012, o ministro Eduardo Cardozo (Justiça) deu uma entrevista à Folha em que falava sobre propostas para reduzir o grau de homicídios.
Para a UNODC, em tradução minha, “esforços para prevenir homicídios não serão efetivos a não ser que os governos e a comunidade internacional orientem as atenções para quem está mais sob risco, tanto de se tornar o agressor quanto de se tornar uma vítima. Mais de metade de todas as vítimas de homicídios têm menos de 30 anos. Muito dessa violência ocorre em áreas urbanas. Políticas e estratégias efetivas devem não só ter foco em jovens sob risco mas também envolver esse grupo e a comunidade local em um trabalho conjunto para quebrar o ciclo da violência”.