Menos dois pandas na diplomacia

Por johanna nublat

A China anda preocupada com um de seus animais preferidos, usado inclusive como instrumento de “soft power” na diplomacia: o panda.

Segundo a imprensa nacional, dois pandas morreram, no intervalo de menos de um mês, de cinomose canina (vírus que costuma ser comparado ao sarampo humano), em um mesmo centro de criação na província de Shaanxi.

Os dois pandas tinham 8 anos de idade –Cheng Cheng morreu em 9 de dezembro e Da Bao, no último domingo (4).

Como a taxa de mortalidade desse vírus nos pandas é muito alta e pelo menos dois outros animais apresentaram sintomas da doença, o país colocou 30 experts para cuidar dos bichos e anunciou recursos para evitar que o vírus se espalhe –outros 18 pandas do centro foram dispersados e isolados, segundo a agência estatal de notícias Xinhua.

Centros como esse em questão têm sido usados pelo governo como um esforço para aumentar o número de pandas, por meio de técnicas de reprodução artificial e cuidados específicos com os filhotes. De acordo com o órgão nacional responsável por assuntos florestais, o número de pandas mantidos em centros chegava a 328 em novembro passado –e estima-se que, na natureza, o número de pandas esteja em torno de 1.600.

Segundo a WWF (cujo símbolo é o panda), hoje os pandas só são encontrados na China, mas, no passado, também existiam nos vizinhos Myanmar e Vietnã.

Em seu site, o órgão de florestas chinês informa que, além dos pandas nascidos na China continental, há animais cedidos a Hong Kong, Macau e Taiwan. E, ainda, a países como Estados Unidos, Japão, Austrália e Espanha, “como empréstimo para funções diplomáticas, amizade e pesquisa”.

O embaixador chinês nos Estados Unidos, Cui Tiankai, chegou a brincar, em um artigo publicado em 2013, que, na verdade, eram dois os embaixadores da China em Washington: ele e o simpático filhote Bao Bao. 

Entre 1957 e 1983, 24 pandas foram oferecidos pela China a outros países como “embaixadores da boa vontade”, segundo o artigo “Diplomats and refugees: panda diplomacy, soft ‘cuddly’ power, and the new trajectory in panda conservation” (Kathleen Carmel Buckingham, Jonathan Neil William David e Paul Jepson).

No texto, publicado em 2013, os autores contam que o termo “diplomacia do panda” foi cunhado durante a Guerra Fria, época em que Mao Zedong começou a distribuir os pandas em busca de amizades estratégicas –em 1965 para a URSS e Coréia do Norte, 1972 para os Estados Unidos e 1974 para o Reino Unido.

É o que eles chamam de “primeira fase” da diplomacia do panda nos tempos modernos –a prática já era usada desde as dinastias chinesas.

Na fase fase seguinte, a oferta dos pandas migrou de interesses geopolíticos para financeiros, com foco nas cidades estratégicas para produtos chineses. Os autores relatam que, entre 1984 e 1987, pandas foram alugados a oito zoológicos por US$ 50 mil mensais por animal.

O artigo indica o surgimento de uma terceira fase nos últimos anos, em que os pandas são negociados com países que oferecem à China recursos naturais e tecnologias valiosos, como urânio e salmão.

“Esses presentes-empréstimos podem ser entendidos como uma expressão de ‘guanxi’ em acordos bilaterais envolvendo a China. ‘Guanxi’ descreve redes personalizadas de influência e um aprofundamento de relação em que os membros avançam para um círculo íntimo, caracterizado por confiança, reciprocidade, lealdade e longevidade. De uma perspectiva chinesa, dividir o cuidado de um animal tão precioso reforça esses laços. Em resumo, empréstimos de pandas não são simplesmente parte de um negócio mais amplo; eles representam um ‘selo’ de aprovação”, diz um trecho do artigo, em tradução minha.

Para o bem dos simpáticos pandas (e, pelo visto, da diplomacia chinesa), é bom torcer para que os casos desse vírus não se transformem em uma epidemia.