Em um vôo para Pequim, no ano passado, me vi no meio de uma enrascada: me recusei a trocar de lugar com um passageiro chinês –trocaria um corredor pelo assento do meio– e acabei separando o chinês de sua mulher, também chinesa.
A falta de dois lugares juntos fez o passageiro dar um escândalo antes de o avião decolar. Mas não teve jeito: o avião partiu com o chinês sentado cinco fileiras à minha frente, espremido entre duas passageiras, enquanto eu estava no meu corredor, sentada ao lado da mulher do chinês, que me olhava bastante descontente.
Assim que o aviso de afivelar os cintos se apagou, o chinês levantou e recomeçou o bate-boca nervoso com os comissários, reclamando em um chinês incompreensível para mim –e, aparentemente, para a tripulação francesa.
Cedi, para acabar com a discussão e, também, porque me imaginei estragando uma viagem romântica do casal a Paris.
Mas eis que diversas notícias na imprensa local –e algumas até em jornais estrangeiros– questionam o comportamento de parte dos turistas chineses, em voos e nas cidades para onde viajam, seja dentro ou fora da China.
“Turistas chineses encorajados a se comportarem no exterior”, era o título de uma matéria da Xinhua, agência estatal de notícias, publicada em agosto de 2013. Ainda em 2006, na mesma agência: “Turistas chineses incitados a se comportarem”.
Na matéria de 2013, a Xinhua escreve que “cuspir na rua, fazer barulho nos restaurantes e brigar por um lugar para tirar fotos, essas maneiras pouco civilizadas estragam a tradicional imagem da China de ‘um país da etiqueta'”, em minha tradução do inglês.
Mais recentemente, as notícias de destaque são de passageiros provocando confusão em voos.
Em janeiro, a Xinhua noticiou que 25 passageiros foram levados pela polícia de Kunming depois de forçarem a abertura de três saídas de emergência de um avião que estava em solo e discutirem com a tripulação. Segundo os passageiros, eles tentavam evitar a partida do voo, depois de muitas horas de atraso e de discussões acaloradas com o co-piloto.
Em dezembro, um voo da Tailândia para a cidade chinesa de Nanjing teve que voltar ao aeroporto de origem depois de uma briga entre passageiros chineses e os comissários. Segundo explicou a Xinhua, um casal de chineses reclamou por viajar separados, pela demora em conseguir água quente solicitada à tripulação e por algum problema a respeito do pagamento pela água. Irritados, relata a agência, jogaram água quente na comissária. E a confusão ainda continua com mais discussão, pulos dentro do avião, etc.
É claro que só uma pequena parte dos turistas chineses causa problemas como esses –num universo calculado de cerca de 100 milhões de viagens internacionais feitas por chineses em 2014. Mas, como diz a própria Xinhua, “casos de vandalismo existem em abundância e têm, em grande medida, constrangido a China”.
Até o presidente Xi Jinping já se manifestou a respeito desse assunto. No ano passado, recomendou que os turistas chineses não jogassem garrafas de água em qualquer lugar ou destruíssem corais. Esse reforço também foi divulgado pelas autoridades ligadas ao turismo, que querem que as agências de turismo monitorem melhor os grupos.
O blog sobre a China do jornal “The Wall Street Journal” resumiu assim a situação: “Esqueça bolsas da Louis Vuitton, a fúria aérea ‘is the new black’ na China”.