Mesmo deixando de lado a fantasia de que a população da China se alimenta de cachorros e escorpiões, a comida chinesa é, sim, estranha. Ou, pelo menos, ela parece estranha.
Nem sempre é fácil identificar todos os legumes e carnes que estão no prato. E, com frequência, o gosto não é o que você espera –se tem cara de salgado, pode ser doce, como por exemplo um popular “mexido” de ovo e tomate.
Além disso, resta sempre a dúvida: do que são feitos os molhos que acompanham quase todos os pratos?
O estranhamento faz com que muitos turistas e expatriados fujam da comida chinesa, o que não é tarefa difícil considerando as vastas opções de restaurantes estrangeiros nas grandes cidades.
Esse mundo desconhecido me fez torcer o nariz para o mapo doufu, um prato feito com tofu e que é tradicional da província de Sichuan.
Imaginava que vários produtos artificiais eram combinados para culminar nesse resultado brilhante e “molhado”.
Até que um dia, em uma das aulas de culinária que fiz por aqui, o mistério do mapo doufu se desfez. O prato é feito “apenas” com tofu, uma variedade local de verdura que tem algo de alho-poró e algo de cebolinha, gengibre, alho (esses três últimos formam a base do tempero chinês), pimenta de Sichuan (que adormece a boca), pasta de feijão/soja, açúcar, shoyu, água, óleo para cozinhar, óleo de gergelim, sal e amido.
Ou seja, nada de outro mundo.
Em outra aula, entendi o que dá consistência aos molhos que acompanham praticamente todos os pratos (simplesmente amido) e ouvi uma explicação convincente para o uso frequente (e, talvez, até exagerado) deles: “O arroz é seco, precisamos de algum molho!”, disse a chef Chunyi.
Chunyi é a professora da Hutong Cuisine Cooking School, uma das escolas de Pequim que oferecem cursos rápidos para estrangeiros interessados em desbravar a culinária chinesa ou apenas entender melhor a cultura local. Outra escola famosa por aqui é o The Hutong.
Geralmente, as aulas duram entre duas e quatro horas e fazem um recorte da culinária chinesa. Assim, é possível fazer aula de dumplings, culinária de Pequim, Sichuan vegetariana, pato de Pequim 1 e 2, passeio pelo mercado, etc.
Não é uma atividade barata: cada curso custa um pouco mais de R$ 100. Mas permite decodificar essa gastronomia tão complexa e entender melhor o significado da comida para o chinês. Como as duas escolas ficam dentro de hutongs (espécie de bairros tradicionais de Pequim), as aulas também dão a oportunidade para que o turista entenda como viviam –e ainda vivem alguns– chineses de séculos passados.